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Eclésia Adulterada

Eclésia Adulterada

 

A Igreja de Cristo, a verdadeira, a autêntica Noiva do Cordeiro, nasceu e deu seus primeiros passos nas humildes, porém hospitaleiras residências judaicas, principalmente nos dois primeiros séculos. Desnecessário apontar as inúmeras e significativas passagens bíblicas que não só constatam como fundamentam essa afirmação. Relatos bem didáticos no livro de Atos dos Apóstolos nos revelam, em essência, sua organização comunitária, no sentido mais amplo do termo e, a forma como a mesma era, por assim dizer, administrada.

Eram os tempos da Eclésia, do povo chamado a se retirar do mundo envolto em pecados para uma nova vida, um renascimento completo em direção ao caminho, a verdade e a vida, ou seja, Jesus Cristo de Nazaré.

E foi o próprio Cristo, como fundador e mantenedor de sua igreja até hoje, que projetou sua organização, dando-lhe o contorno original, onde, basicamente, dois personagens interagem neste sistema: Pastor e ovelha. Nosso Senhor e Salvador lança mão em algumas passagens dessas figuras, acrescentando-as elementos relacionados já insinuados no Antigo Testamento, com, por exemplo, cajado, aprisco, lobo, ovelha desgarrada, pasto, etc. E, ele mesmo, na qualidade de primeiro e único Alfa e Ômega, aparece nas páginas da Escritura incorporando as duas faces, ou seja, pastor e cordeiro. Obviamente que de uma forma especial, a saber, o Sumo Pastor e o Cordeiro de Deus.

O que ao mesmo tempo cuida e é sacrificado. Tudo por amor a nós.

Não por acaso, o pastorear, na visão de Cristo, envolve direta e objetivamente essas duas funções: o cuidar e o sacrificar. Juntas, fundem-se em um só termo: o apascentar. A função primordial de todo e qualquer pastor. Nem é preciso dizer que o Cristo Jesus foi o único a desempenhar essa função com perfeição. Daí o título Sumo Pastor, encontrado na Bíblia.

Observando as Cartas do Novo Testamento, vemos que os discípulos e apóstolos procuravam seguir os passos do Salvador, se dedicando com afinco, zelo e desprendimento à atividade do pastoreio. Independente da nomenclatura que recebem (pastor, presbítero, bispo, ancião), o que deve ser observado é a forma como se comportam diante e em relação ao rebanho que Deus colocou sob seus cuidados.

Interessante notar, por exemplo, ao final de algumas cartas de Paulo, o modo como ele várias vezes se dirige, quer com lembranças, saudações ou exortações, a irmãos em particular, citando-os nominalmente. Pedro e João não por acaso fazem a mesma coisa. Ora, um bom pastor conhece suas ovelhas. As chama pelo nome. Tem intimidade com elas, sabe de suas reais necessidades, vivencia seus problemas. Enquanto esteve na terra, Jesus Cristo agiu assim. Basta observar entre outros, seu diálogo com a mulher samaritana, para constatar que ele tratava as pessoas caso a caso, individualmente. Jesus andava com suas ovelhas, entrava em suas casas, ceava com elas. Essa é a essência da verdadeira Eclésia. O livro de Atos dos Apóstolos só confirma cada palavra.

Infelizmente essa igreja, na prática, está quase extinta. E, aparentemente, os poucos remanescentes que encontramos parecem estar perdendo completamente o entusiasmo por ela, ou seja, esfriando, acomodando. A Eclésia original está sendo adulterada sistematicamente diante de nossos olhos, dia após dia, sem que nada seja feito para mudar o quadro.

Muitas organizações registradas sob o epíteto igreja, comportam-se como qualquer coisa, menos como uma igreja cristã deveria se comportar.

Em primeiro lugar, temos os pastores sem rebanho. Uma praga advinda do pentecostalismo, que criou uma aberração eclesiástica chamada Pastor Itinerante, algo que não possui nenhuma fundamentação bíblica. Temos pastores, evangelistas, apóstolos, mestres e profetas, mas nunca, em tempo algum, tivemos pastores itinerantes. Advinha quem lançou a moda?

Ora, uma igreja é um rebanho. Um aprisco. Quem faz a analogia é Jesus Cristo não um qualquer. E, nesta condição, precisa e deve, biblicamente, ser pastoreada. Pastores foram chamados para apascentar, é sua razão de ser e viver dentro da Eclésia, ou seja, cuidar e sacrificar. E o que vemos hoje?

Pessoas se dirigindo a organizações para-eclesiásticas, lideradas por alguém que jamais irá a sua casa saber de seus problemas, ainda que seja convidado, por que isso certamente causaria tumulto, embora mesmo dentro do tumulto, Jesus tinha tempo para parar e perguntar Quem me tocou?. Líderes que jamais sentarão à sua mesa e que nunca a chamaram pelo nome. A quem, afinal, estão apascentando? Não seria a si mesmos?

Atraídas pela pregação da vitória fácil, sem lutas, do milagre urgente (como se houvesse milagres supérfluos), da prosperidade material a qualquer preço, enfim, única e exclusivamente dos sinais sobrenaturais, as pessoas aceitam a negociata sem saber ao certo onde vão parar ou as conseqüências espirituais que isso pode gerar. Entregam tudo o que tem para poder receber de Deus algo em troca, mas nunca se tornam aquilo que deveriam se tornar: ovelhas. Não entendem que, aos olhos da liderança que seguem não passam de mais um número no relatório de arrecadação.

A massificação dos meios de comunicação e o marketing atingem níveis tão agressivos que fazem inveja a grandes corporações, e conseguem fazer até crentes de denominações biblicamente fundamentadas se sentirem balançados com o apelo emocional mostrado nas chamadas televisivas.

Existem hoje, no Brasil, milhares de crentes que fazem parte de um estranho fenômeno que explodiu nesta última década: o duplo pastoreio. Funciona assim: as pessoas agora têm dois pastores, um local e o outro na televisão. Duas mensagens distintas, duas doutrinas divergentes, duas homilias díspares. Alguém já se deu conta de onde isso vai parar? Na fragmentação espiritual que essa prática pode produzir?

Com o advento do duplo pastoreio, criou-se uma saia justa eclesiástica que beira o ridículo. Ela ocorre quando o pastor local tem um posicionamento diferente do pastor da mídia. Em quem a ovelha vai acreditar? Naquele nome famoso, que arrasta multidões ou no pastorzinho que mora na esquina e que tem uma dificuldade enorme para fazer os irmãos aparecerem no culto de doutrina? No que anda sempre em ternos alinhados e cercado de segurança para todos os lados ou no dirigente da igreja que vive com o carro na oficina e usa ternos comprados na pechincha?

Definitivamente, isso não é igreja.

A questão é, quem ora por mim, pela minha falta de emprego, pelos meus problemas com minha família, que me visita quando estou no hospital? O grande pregador vai sair de sua cidade para fazer isso, como o fez Jesus quando partiu para Betânia para ressuscitar Lázaro? Quem senta comigo à mesa para me ouvir desabafar? Um DVD teria esse poder?

E, finalmente, a face mais cruel desse novo modo de vivenciar a Eclésia, se reflete na questão financeira. Quantas pessoas nós não conhecemos, que há anos fazem parte de uma denominação evangélica e que, mensalmente, contribuem, com dificuldade, tirando às vezes de onde não podem nem devem tirar, com esses ministérios que não tem nenhum envolvimento com elas, senão o financeiro?

Irmãos que reclamam do salário do pastor que cuida delas, que sempre acha caro a aquisição de qualquer material para o templo onde congrega, que nunca tem para ofertar nas campanhas de reforma da Casa de Oração onde tantas vezes foram alimentados e abençoados, mas que não pensam duas vezes em desembolsar quantias vultosas para organizações que se utilizam da falácia de manter programas na mídia como arma de evangelização, quando no fundo o que vemos são interesses financeiros e políticos bem costurados, o que pode ser provado a cada eleição onde uma a uma, busca seu espaço na máquina do Estado, desrespeitando a Constituição que define a separação Estado x Igreja. Depois reclamam da ingerência do Poder Público dentro delas. Ora, se se metem em coisas do Estado, por que o Estado não se meteria nas coisas delas?

Definitivamente, mesmo, isso não é igreja.

Há pessoas que, de uma só vez, depositaram na conta dessas instituições um valor maior do que elas contribuem o ano todo em suas congregações, onde são acompanhadas, pastoreadas, alimentadas com a Palavra, enfim, apascentadas. Onde foram recebidas por Jesus Cristo, batizadas, discipuladas, onde pela primeira vez pregaram, louvaram ao Senhor.

É de se perguntar: isso é justo?

É justo saber que muitas denominações biblicamente fundamentadas possuem dezenas, centenas de missionários em dificuldades assustadoras pelo interior do Brasil, e que tem dificuldades para mantê-los e eu, que faço parte de uma delas deixo de contribuir para mandar minha oferta para alguém que só conheço de nome?

Pois é. Foi aqui que chegamos. Quando pensávamos que já tínhamos visto de tudo, vemos homens alardeando na TV que Deus escolheu esse ou aquele ministério pata mudar o Brasil. Não é ministério nenhum que vai fazer isso. Deus não escolheu ministérios, Deus escolheu pessoas.

 

Pr Neto Curvina