Esforçai-vos
“Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque eu vos digo que muitos procurarão entrar e não poderão” (Lucas 13:24)
Esse texto não é o que parece. Durante anos, temos gritado sobre essa advertência de Cristo acerca das duas portas, a estreita e a larga (cf. Mateus 7:13), jogando o mundo na primeira, e a igreja na segunda. Mas a questão é que aqui, neste caso, Jesus não está se referindo a essa divisão. Jesus não está chamando a atenção do mundo. Ele está chamando a atenção da igreja.
E podemos chegar a essa conclusão a partir de duas colocações de Cristo.
Primeiro ele diz: “muitos procurarão entrar e não poderão...”
Ora, o mundo não vai procurar entrar. Na verdade o mundo nunca quer entrar. A maior parte da humanidade admite não precisar de Cristo para nada. Não dá ouvidos à sua Palavra e muitas vezes até duvida de sua existência. Em Mateus 24:37-39 ele diz “Como foi nos dias de Noé, assim também será a vinda do Filho do homem. Pois assim como nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca, e não perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos – assim será também a vinda do Filho do homem”. Em suma, o mundo não vai procurar a salvação. As trevas não ligam para isso.
A segunda frase que denuncia que ele não está se referindo ao mundo é a do versículo 26 “Então direis: comemos e bebemos na tua presença, e tu ensinaste nas nossas ruas”. Comer e beber. Conviver. Estavam ao seu lado, convivendo com ele, ouvindo sua Palavra. O seguiam, o acompanhavam. Estavam conscientes de quem ele era e o que o sua mensagem representava. Estavam mais perto dele do que do mundo. Viam os sinais do seu poder. Os milagres, os pães e peixes multiplicados, os enfermos curados, os mortos ressuscitados. De tal modo, que quando chegou o momento do acerto de contas, sabiam qual porta procurar, mas infelizmente, mas não lhes foi permitido entrar por ela. Exatamente o que acontecerá no dia de sua vinda.
As igrejas estão cheias de pessoas assim. Vão aos cultos, louvam, oram, participam da ceia do Senhor (‘comemos e bebemos’), ofertam, até mudam sua aparência, mas não percebem que algo está errado e que pode ser uma armadilha fatal para suas vidas por toda a eternidade. O mistério se revela no versículo 27 “Apartai-vos de mim, vós todos os que praticais a iniqüidade...”.
‘Praticar’ é fazer, exercer, agir de uma forma tal. Vemos igrejas onde a santidade das pessoas é medida pelo comprimento da roupa o do cabelo. Temos ainda as que passam o culto inteiro mostrando sinais e esquecem de ensinar o Evangelho. Se eu estiver com a roupa certa, a gravata correta, o terno alinhado, vou ter oportunidade, senão, vou ter que providenciar um. Por outro lado, se não passo o culto inteiro gritando, sapateando, ou falando o que ninguém entende, sou frio, não tenho unção e talvez nem conheça o Espírito Santo, independentemente de como é minha vida fora da igreja. No cristianismo que é pregado hoje, a forma é mais importante que o conteúdo.
Mas Jesus pregava diferente. Ele não media as pessoas – nem mede – as pessoas pelo que elas faziam quando estavam perto dele (“comemos e bebemos na tua presença”).
Por isso concluímos que o texto se refere ao mundo da igreja. Porque ser crente na hora do culto, diante de todos, em um ambiente espiritual, não é tão difícil, embora ainda haja os que nem assim conseguem. E ao ler outras passagens do Evangelho, concluímos que ele, sim, está falando à igreja, alertando para os riscos de não se ter uma vida cristã diária e, principalmente, fora do culto.
Mateus 7:21-23 “Nem todo o que me diz, Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E em teu nome não expulsamos demônios? E em teu nome não fizemos muitos milagres? Então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade”.
Ora, o mundo não expulsa demônios, não fala em nome de Jesus, não profetiza. É óbvio que ele está se referindo às igrejas, aos que se chamam pelo seu nome e dizem ser seu povo. E, ao final, ele mais uma vez revela o que realmente quer: a prática. No versículo posterior ele insiste “Portanto todo aquele que ouve as minhas palavras e as pratica, será semelhante ao homem prudente, que edificou sua casa na rocha”. Mais uma vez, a mesma preocupação: a prática do Evangelho.
A grande questão é: quem somos nós quando estamos longe de um ambiente espiritual?
Como me comporto em meu ambiente de trabalho?
Como me comporto em sala de aula?
Como me comporto em relação a movimentos sociais?
Como me comporto em relação aos meus negócios?
Como me comporto em relação às autoridades?
Como me comporto quando estou rodeado somente por ímpios?
E, principalmente, como me comporto quando estou em casa?
A Bíblia diz que “Aquele que atenta bem para a lei perfeita, a da liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte esquecido, mas fazedor (executor, cf. ACF) da obra, este será bem-aventurado no que realizar” (Tiago 1:25).
E é exatamente por isso, por insistir em servir a Cristo sem se preocupar em pôr em prática seus ensinamentos, que o dia da sua vinda será um dia de alegria para poucos (Mateus 7:14) e tristeza, frustração e decepção para muitos. Muitos que, por muito tempo, achavam estar agradando a Deus, quando na verdade estavam agradando somente a si mesmos. Simplesmente porque negligenciaram o que deveria ser óbvio para todos eles: a prática, ou seja, a execução, o cumprimento, o esforço de fazer da Palavra de Deus uma regra, um manual de vida.
Essa que, sem dúvida, é a missão principal de todo aquele que professa o nome de Jesus. E também a mais difícil. Daí a porta que leva à salvação ser a estreita.
Neto Curvina
Ministro do Evangelho – Comunidade Shalom Filadélfia